Porque a palavra da cruz é loucura para os que perecem; mas para nós, que somos salvos, é o poder de Deus. Porque a loucura de Deus é mais sábia do que os homens; e a fraqueza de Deus é mais forte do que os homens...[1 Coríntios 1:23]

quinta-feira, 13 de maio de 2010

O Espelho (Um conto...)


O Espelho
(Um conto de Cesar Paiva - Sebá)
Depois de caminhar por tempos, um Viajor percebe a que a muito o caminho tornou-se árido e unicolorido e o ar do vento muito mais pesado e empoeirado.
Nos lugares onde antes avistava flores e gramíneas de delicada beleza, agora podia ver vegetais estranhos retorcidos e espinhosos.
O céu antes azul, e por numerosas vezes cortado por alegres bandos de aves a emitir cantos e pios sonoros, agora se fazia cinzento e povoado de nuvens carregadas prestes a se precipitarem sobre ele, sob forma de chuva torrencial.
Um estranho medo e desconforto tomavam conta de seu coração, quando derrepente avistou ao longe uma bifurcação da trilha do caminho.

- Não ! Só me faltava essa ! Pensava consigo mesmo.

O viajor que nunca foi dado a tarefa de tomar decisões sobre o caminho, e ficou ainda mais incomodado com a configuração que sua caminhada tomava.
Decisões sobre parar nesta ou naquela estrebaria para uma soneca, ou quem caminharia ao seu lado, ou se comeria uma galinha ou uma maça, ou mesmo com quais mulheres dormiria durante a noite, eram coisas fáceis e corriqueiras, mas decidir sobre o caminho a seguir era demasiado pesado para ele, ainda mais naquele momento sombrio em que o cansaço e o desgaste físico e mental tomavam conta de todas suas entranhas.
Suas pernas doíam, os pensamentos vinham e iam desconexos na sua cabeça, hora uma depressão profunda, hora uma euforia avassaladora tomavam conta de sua cabeça e a sua frente aquela inquietante bifurcação no caminho que sempre foi retilíneo.

Estava ele perdido em seus pensamento e angustias quando um Velho Homem surge ao seu lado.
Aquele homem parecia-lhe muito familiar...Onde teria visto aqueles olhos brilhantes e semelhante sorriso ?
Percebia nele algo que falava-lhe alto e fundo ao coração, mesmo que o Velho Homem não proferisse sequer uma palavra.

E assim quebrou o silêncio:
- Salve Velho Homem !!!
Que lhe respondeu quase irônico:
- Salve Novo Homem !!!
Aquela saudação soou como um mix de alegria e sarcasmo, mas pareceu-lhe muito sincera.
- O que te traz até aqui meu velho ? perguntava ele cheio de malícia querendo sondar as reais intenções do enigmático senhor...
- A vida e o caminho me trouxeram até esta bifurcação do caminho. Respondia amável.

- Amores, dissabores, músicas, rituais de todas as naturezas, mulheres, ahhhh !!!! muitas mulheres, buscas incansáveis pela verdade... A força e fé me trouxeram até aqui meu amigo.
O viajor se identifica com aquele velho homem respondendo-lhe:
- Meu velho e familiar amigo... Estas coisas também têm muito haver com a minha caminhada, fiz muito amigos, fui admirado por muita gente, toquei 7 instrumentos como dizia a minha vó, nunca me envolvi em embates que pudessem gerar desafetos e também aqui estou eu nesta bifurcação...

E o velho homem retrucava:
- E teve também aquelas vezes em que você chorou e teu choro solitário para poder sorrir para quem precisava de um sorriso, e aquela outra em que onde cabia um ataque mais contundente você peferiu pedir perdão...
- Ahhhh !!!! Teve aquela outra, onde para que todos ficassem felizes e confortáveis, você preferiu o seu desconforto. Insistia ele....

Neste ponto o viajante achou tudo muito estranho e entreviu...
- Como assim... Como sabe tanto de mim... Como conhece tanto de coisas que estavam tão dentro de mim mesmo???

E o velho homem respondeu...
- Porque eu estava lá... Ninguém mais do que eu sentiu com estas coisas, ninguém mais do que eu se regozijou com tuas alegrias e ninguém mais do que eu chorou com tuas tristezas.
Neste momento o Viajor sentiu um estranho sentimento de ligação por aquele Velho Homem e ao olhá-lo fundo via-se a si mesmo como um encontro perfeito com seu ego.
Suas percepções visuais aguçavam-se e conseguia enxergá-lo como uma copia sua um pouco mais alquebrantada, porém cheia de vida e experiências à trocar...

- Velho homem !, dizia ele.
- Como você andou comigo todo este tempo e jamais tive a percepção de sua presença em minha vida ?
E com os olhos marejados de lagrimas o velho lhe respondeu:
- Meu amado, você precisava realmente se enxergar e ter realmente a percepção de quem você era.
- Precisava detectar qual espaço você ocupava no mundo e na sociedade para poder receber a dádiva de me ver e me conhecer também...

E o viajor alegre, cheio de novas esperanças deu glorias a Deus e profetizava animado sobre seu futuro no caminho:
- Mas que bom isso !!!!! Glorias a Deus por te conhecer, agora poderemos muito mais, agora teremos forças em dobro e seremos fortes !!!!!!

- Acalma-te meu amado...
Retire do teu discurso todos estes plurais, não mais existirá “nós” , “iremos” ou mesmo “seremos”... Falava mansamente o Velho Homem.
-Mas como ?
-Não será assim ? assustava-se o viajor.
-Não meu amado... Percebe que eu apenas te trouxe até aqui, neste lugar e neste momento...
O fato de você ter tido a oportunidade de me conhecer e poder fazer contato comigo é determinante para que você escolha estes dois caminhos, falava apontando para a bifurcação na trilha.
- Percebe como sua caminhada tinha se tornado mais cansativa e triste nos últimos tempos ? Pois bem, de posse deste novo contato e conhecimento, agora você poderá decidir pra onde quer levar sua caminhada.

Apontando para um lado dizia:
- Este caminho é a continuidade da trilha que você vinha trilhando e por aqui continuarei contigo sendo muito mais atuante na sua vida do que você imagina, porém não conseguirá me enxergar a não ser em suas divagações sobre sua própria vida que pouco mudará...
E apontando para a outra bifurcação definia:
- E este caminho é novo e desconhecido para você, porém daqui você consegue olhar lá ao longe mais uma vez aquele céu azul de outrora e as flores que adornavam sua caminhada.
- Neste caminho você trilhará totalmente sozinho com teus pés, porém sempre conseguirá me enxergar para sentir-se seguro e atento a as “nossas” experiências, estarei no cume daquela monte com uma grande fogueira acesa, onde durante o dia você avistará a fumaça e a noite um grande clarão a adornar o firmamento.

O Viajor ainda meio atônito com as grandes mudanças que se apresentavam em sua caminhada tenta realizar um tira teima:
- Então, Velho Homem, um é a continuidade e você seguirá muito atuante comigo, mas não o verei a não ser quando olhar pra dentro de mim e o outro é a mudança em que eu tomarei realmente posse do meu destino, porém você ficará pra traz, mas poderei vê-lo sempre sob uma forma de lembrança consultiva ??? É isso ?

- Exatamente meu amado, dizia o velho homem...
Mas ratificava:
- A escolha é sua... Escolha... Aproprie-se disso, pode fazer o que tu quereres, pois é tudo da lei... Tudo podes naquele que te fortalece...

Depois de muito pensar o viajor escolhe o novo caminho, seduzido por tudo de bom e novo que poderá trazer para a sua caminhada.
- Meu velho amigo, dizia ele, como faremos agora ? Irei por aqui, mas jamais me esquecerei de você e de tantas aventuras que vivemos juntos, tantas loucuras, tantos amores, tantos choros não chorados e tantas explosões de alegria.

E o Velho Homem responde:
- Amado meu, aí é que está a mágica, como já te disse, eu te trouxe até aqui, e como você tinha boca te levei a Roma, e ria de sua própria piada, te fiz famoso em suas bandas de rock, te fiz ator de teatro, graduado, pós graduado, líder estudantil, amado, admirado, ouvido e relevante para vários grupos, te fiz grande para muitos, mas realmente pequei em não te fazer grande para você mesmo.
- É chegada a hora de você ser para você mesmo tudo de grandiosos que você foi para tantas pessoas. Seguir este caminho te permitirá isso... Está certo de seguir por esta nova trilha?

E alegremente o viajor respondia:
- Sim... Estou muito confiante !!!
- Então vá... Foque no presente, no “aqui, agora já”, consulte teu passado comigo sempre, planeje teu futuro a partir de você mesmo e volte correndo para o presente para empreender tuas ações, assim será muito vitorioso e feliz... Dizia o Velho homem.

Neste momento ambos se abraçaram, não numa atitude de adeus, mas de um sincero até breve, tanto o viajor, quanto o Velho Homem sentiam um pelo outro uma extrema sensação de amor e gratidão.
Após este longo e apertado abraço pareciam se fundir um ao outro num acoplamento simbiótico perfeito.

O Viajor começa a dar seus primeiros passos no novo caminho da velha caminhada e olha para traz talvez para conferir se o Velho Homem ficou ao longe observando-lhe.
Mas ao olhar para traz já não o viu mais, mas sim um velho espelho no lugar onde se despediram, porém no cume do monte que o guardava na caminhada, pode ver ao entardecer um grande e poderoso clarão que fazia uma fumaça branca que lhe parecia ter o formato de um grande coração, que se dissipava subindo aos céus como que um louvor de amor e esperança ao grande mestre que tudo criou e que tudo conduz no universo conforme o livre arbítrio dos homens.

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